Última alteração: 2016-10-25
Resumo
Milhares de pessoas foram atingidas pelo rompimento da barragem de rejeitos de mineração do Fundão, ocorrido no início de novembro de 2015, no município de Mariana, Minas Gerais.
Ao longo da Bacia do Rio Doce, as pessoas atingidas de diversas comunidades tiveram perdas de todo tipo, como a morte de familiares, a destruição de moradias, a falta de água potável, a perda de plantações, o prejuízo na produção, a contaminação do rio, a morte dos peixes, etc.
A população atingida, seja pelos impactos diretos ou indiretos do rompimento da barragem, passa por um momento de insegurança sobre as medidas de reparação e de recuperação que serão tomadas na região.
Com base no exposto, e a partir de um estudo legislativo e teórico-bibliográfico, o presente artigo visa analisar o “desastre” ambiental, político, econômico e social causado pelo rompimento da barragem de Fundão, no município de Mariana, Minas Gerais. Isso, com o objetivo de aprofundar as características relacionadas à participação social no processo de negociação dos atingidos por barragens no Brasil e no mundo.
No âmbito da participação social, o primeiro passo a ser considerado é a dimensão do conceito de atingido, que deve ser amplo, capaz de reconhecer o conjunto de famílias e grupos sociais que tiveram seus direitos humanos violados em tal desastre.
Assim como aponta o relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), identifica-se um conjunto de direitos sistematicamente violados em situações que envolvem atingidos por barragens, dentre os quais se destacam o direito à informação, à participação e à justa negociação.
Apesar de possuir uma estrutura legal e normativa sobre a proteção aos direitos humanos, o Brasil ainda convive com limitações no pleno exercício dos direitos de populações atingidas.
Nesse ponto, a garantia do pleno exercício dos direitos humanos encontra-se, principalmente, na presença de uma sólida organização da sociedade civil, informada e vigilante.
Ações governamentais ou aparatos normativos, evidentemente indispensáveis, ganham outros significados e maior eficácia quando autênticas representações da sociedade civil são capazes de constituírem-se, ampliarem suas bases sociais e agirem sem constrangimentos e restrições.
Desse modo, cabe ao Estado brasileiro e às demais instâncias públicas propiciarem e favorecerem a constituição de sujeitos coletivos autônomos e legítimos.
E, para tanto, deve-se promover a difusão de informações que, de fato, capacitem populações atingidas e garantam o efetivo processo de participação social. A disponibilização da informação com linguagem acessível deve permitir o esclarecimento prévio das partes envolvidas, possibilitando o envolvimento da sociedade civil nos processos decisórios incidentes sobre seus direitos e interesses.
Há que se considerar, ainda, que o conflito, a interlocução e negociação são partes essenciais e complementares de processos democráticos e participativos.
As negociações, sobretudo aquelas nas quais empresas com grande poder econômico figurem como parte, devem ocorrer em condições de igualdade e respeito pelos critérios coletivamente acordados, para que não paire sobre o processo de negociação qualquer constrangimento ou restrição.
Nesse aspecto, a atuação de representantes do Poder Público e de entidades de defesa de direitos humanos é indispensável, em particular, no empoderamento das pessoas atingidas de modo a contrabalançar o desequilíbrio de poder e meios que, via de regra, marca esses processos.
Conclui-se, por fim, que este estudo ressalta o compromisso do Estado brasileiro com o fortalecimento da sociedade civil nos processos de negociação de conflitos envolvendo atingidos por barragens, considerando, dentre outros pontos, a publicidade das informações, o reconhecimento e a efetividade da participação social, o protagonismo das populações atingidas, o papel do Estado (em âmbito federal e estadual) no processo de negociação e articulação e a definição de regras, critérios e parâmetros de indenização e reparação como objeto de negociação coletiva.